O romance “Kairos” da autora alemã Jenny Erpenbeck, traduzido para o inglês por Michael Hofmann foi agraciado com o prestigiado International Booker Prize, em uma cerimônia realizada na Tate Modern em Londres no dia 21 de maio.
Os prêmios Booker tem como objetivo premiar os melhores da ficção numa base global, quer a obra tenha sido originalmente escrita em inglês (Booker Prize) ou traduzido para o inglês (International Booker Prize). Criado em 2005 como o International Man Booker Prize, o prêmio era entregue bienalmente a um conjunto de obras. No entanto, em 2015, as regras do Booker Prize foram ampliadas para permitir a entrada de escritores de qualquer nacionalidade desde que seus livros fossem escritos em inglês e publicados no Reino Unido. Assim, aderindo as mudanças o International Booker Prize passou a ser entregue anualmente a uma única obra de ficção, escrita em outro idioma, traduzida para o inglês e publicada no Reino Unido ou Irlanda, prestando homenagens tanto a autores como tradutores, que dividem igualmente o prêmio de 50 mil libras esterlinas.
“Eles abrem as barreiras da mente e criam uma comunidade mundial de leitores. Nós não nos damos conta de como é excepcional ler um livro traduzido, da maneira como caímos em outro mundo, em uma realidade paralela... O poder do tradutor é nos convencer a entrar nesse mundo da imaginação”, disse Eleanor Watchel, presidente do júri durante a cerimônia.
Kairos
O primeiro livro traduzido do alemão a ganhar o International Booker Prize é uma história íntima e devastadora da trajetória de dois amantes através das ruínas de um relacionamento, tendo como pano de fundo um período turbulento da história europeia. Sendo que a tradução de Michael Hofmann é destacada pelo juri por captar “a eloquência e as excentricidades da escrita de Erpenbeck, o ritmo das suas frases contínuas, a extensão do seu vocabulário emocional”.
Em Berlim Oriental, em 1986, um homem e uma mulher se encontram por acaso em um ônibus. Ela é uma jovem estudante de 19 anos, ele é mais velho, 50 anos, e casado. A atração deles é intensa e repentina, alimentada por uma paixão compartilhada pela música e pela arte, e intensificada pelo sigilo que devem manter.
Mas quando ela se perde por uma única noite, ele não consegue perdoá-la e uma fissura perigosa se forma entre eles, abrindo espaço para a crueldade, a punição e o exercício do poder. E o mundo à sua volta também está a mudar: à medida que a Alemanha Oriental começa a desmoronar, o mesmo acontece com todas as velhas certezas e velhas lealdades, inaugurando uma nova era cujos grandes ganhos também envolvem perdas profundas.
Segundo o juri “o que torna Kairos tão incomum é que ele é ao mesmo tempo bonito e desconfortável, pessoal e político. Erpenbeck convida você a fazer a conexão entre esses desenvolvimentos políticos que definiram uma geração e um caso de amor devastador e até brutal, questionando a natureza do destino e da agência”.
A autora
Nascida em 12 de março de 1967, na Berlim Oriental, a diretora de ópera, dramaturga e premiada romancista, Jenny Erpenbeck, vem de uma família ligada aos livros, pois seu pai, John Erpenbeck é escritor físico e filósofo, e sua mãe, Doris Kilias é uma tradutora àrabe. Já seus avós eram ambos atores.
Em Berlim, Erpenbeck completou um aprendizado de dois anos como encadernadora, depois trabalhou como gerente de adereços teatrais antes de estudar direção de teatro musical e desfrutar de uma carreira de sucesso como diretora de ópera no final dos anos 1990. Mesma época em que deu inicio a sua carreira como escritora publicando sua novela de estreia “Geschichte vom alten Kind” (The Old Child) em 1999.
Além de “Kairos” várias outras obras da autora foram traduzidas para mais de trinta idiomas fazendo dela mais conhecida no exterior do que em sua terra natal. Entre suas obras estão “The Book of Words” (2008), “Visitation” (2010), “The End of Days” (2014), “Not a Novel: Collected Writings and Reflections” (2020), “Go, Went, Gone” (2017). Sendo que, em 2019, o romance “Visitation” foi eleito um dos cem melhores livros do século 21 pelo The Guardian, o livro “The End of Days” foi vencedor do Independent Foreign Fiction Prize, e o “Go, Went, Gone” foi indicado para International Booker Prize 2018.
Sobre “Kairos”, em entrevista ao Booker Prize, a autora diz que é “uma história privada de um grande amor e da sua decadência, mas é também uma história da dissolução de todo um sistema político. Simplificando: como algo que parece certo no começo pode se transformar em algo errado?”, ressaltando que se “você observar os detalhes do que é falado e onde há silêncio, você também será capaz de acompanhar as correntes invisíveis, a mudança de poder entre gerações, as técnicas de manipulação e abuso”.
O tradutor
Nascido em 25 de agosto de 1957 em Freiburg, na Alemanha, o poeta, revisor e tradutor, Michael Hofmann também veio de uma família com tradição literária, com seu pai Gert Hofmann sendo um escritor e seu avô materno tendo editado a “Brockhaus Enzyklopädie”.
Descrito pelo The Guardian como “indiscutivelmente o tradutor de alemão para inglês mais influente do mundo”, Hofmann traduziu o trabalho de vários autores renomados como Franz Kafka, Joseph Roth e Hans Fallada. Além de ter recebido diversos prêmios literários, incluindo o Independent Foreign Fiction Prize em 1995 pela tradução do romance de seu pai, “The Film Explainer”.
Tendo se formado em Língua Inglesa e Clássicos, Hofmann lecionou em diversas universidades, mas desde de 1990 leciona na Universidade da Florida, em Gainesville, onde ministra oficinas de poesia e tradução. Sendo que, em 2018, ele foi convidado a fazer parte do juri do International Booker Prize, e em 2023, foi eleito Fellow da Royal Society of Literature.
Sobre “Kairos”, em entrevista ao Booker Prize, o tradutor diz que a “diferença de idade não é o ponto. O ponto é o personagem. Mesmo que Katharina pudesse ter conhecido uma versão de Hans quando ele era 20 anos mais novo, ele seria o mesmo personagem. O caráter é o que importa – se alguém está manipulando ou escondendo grande parte de sua vida. Um homem mais velho olha para uma jovem com certo prazer? Isto é normal. Você admira a beleza. Você fica feliz em olhar para algum jovem, homem ou mulher, não importa. Não é um crime. Só se você usar sua experiência para manipular alguém, como Hans faz com Katharina.”
Saiba mais sobre o prêmio no site oficial do International Booker Prize.
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